Arqueólogos anunciaram a descoberta de ruínas de uma igreja antiga na antiga cidade de Listra – hoje sítio arqueológico na Turquia – que, segundo os pesquisadores, pode ser um dos vestígios físicos das viagens missionárias do apóstolo Paulo. A edificação mede cerca de 30 metros de comprimento, com mosaicos dourados e paredes ornamentadas, e estaria erguida desde o fim da Antiguidade (século V). Essa descoberta assume enorme importância porque Listra é mencionada diversas vezes no Novo Testamento como palco das pregações de Paulo – inclusive nos relatos em que ele e seu companheiro Barnabé são confundidos pelos moradores com deuses gregos, após praticarem milagres.
Por que esse achado interessa aos cristãos
Validação histórica da narrativa bíblica: Encontrar uma igreja cristã antiga exatamente no local onde as Escrituras situam Paulo fortalece a confiabilidade dos relatos bíblicos. Para quem defende a historicidade da Bíblia esse tipo de evidência reforça o argumento de que os eventos narrados não são meras lendas, mas aconteceram de fato.
Cristianismo primitivo concreto: A igreja não é um artefato isolado; a presença de mosaicos, ornamentos e sua dimensão indicam que Listra não era um ponto secundário, mas sim um centro de comunidade cristã antiga – o que confirma que o cristianismo se espalhou rapidamente e de forma organizada, desde os primeiros séculos.
História real por trás da fé: Muitos críticos afirmam que a fé cristã se baseia unicamente em tradições orais ou textos. Este achado mostra que há registros arqueológicos palpáveis que dialogam com os relatos escritos na Bíblia, mostrando que fé e história podem caminhar juntas.
Além disso, essa descoberta soma-se a outras recentes – como a de igrejas antigas no Egito, descobertas por arqueólogos e datadas de mais de 1.600 anos.
Fé confirmada, apologética fortalecida
Para nós que defendemos uma cosmovisão criacionista, a arqueologia é uma aliada poderosa – não porque dependa dela, mas porque, quando confirma relatos bíblicos, ela dá ainda mais confiança de que a Escritura retrata realidades históricas e fatos concretos.
Esse tipo de evidência arqueológica ajuda a combater a narrativa de que a Bíblia seria mera mitologia ou metáfora. Ajuda a mostrar que os eventos da vida dos primeiros cristãos – as viagens missionárias, os testemunhos, a fundação de igrejas – realmente aconteceram. E, por isso, fortalece a fé, reforça a credibilidade da Palavra de Deus e dá base racional ao criacionismo histórico.
Se a fé já é companheira da esperança, da convicção espiritual e da confiança no Criador, quando arqueologia e ciência corroboram a historicidade dos textos sagrados, a fé se torna também uma convicção informada e consciente.
Cada ruína, cada mosaico, cada descoberta arqueológica que confirma a Escritura é uma pontada de esperança. É um lembrete de que não vivemos de mitos, mas de verdades reais, que atravessam séculos. E que a história que cremos – do Gênesis até a nova criação – continua sendo registrada, fragmento a fragmento, evidência a evidência.
Exposição oferece rara oportunidade para exibição pública do Pergaminho dos Dez Mandamentos
A Biblioteca e Museu Presidencial Ronald Reagan em Simi Valley, Califórnia, tem uma nova exposição que oferece aos visitantes uma compreensão mais profunda do judaísmo antigo e dos primeiros fundamentos do cristianismo. A exposição, “Manuscritos do Mar Morto: A Exposição”, apresenta uma coleção especial de oito manuscritos judaicos antigos e 200 achados arqueológicos que datam de mais de 2.000 anos. Acredita-se que os pergaminhos datem de 250 a.C. a 68 d.C. Mais notavelmente, a biblioteca — começando em 11 de abril e durando apenas duas semanas — apresentará o Pergaminho dos Dez Mandamentos, exibido pela primeira vez na Califórnia. Ele não é visto nos EUA desde 2013 e oferece “uma rara oportunidade de explorar um dos textos mais significativos da história religiosa”.
David Trulio, presidente e CEO da Fundação e Instituto Presidencial Ronald Reagan (RRPFI), disse à Fox News Digital: “A fé cristã do presidente Reagan era fundamental para sua identidade.” E acrescentou: “Ele se envolveu com judeus e cristãos durante sua presidência. À medida que avançamos em seu legado, apreciamos muito a oportunidade de compartilhar esses notáveis tesouros bíblicos que aprofundam nossa compreensão das escrituras, das primeiras comunidades religiosas e do desenvolvimento das principais religiões monoteístas praticadas hoje. Agradecemos muito a oportunidade de compartilhar esses notáveis tesouros bíblicos.”
Melissa Giller, diretora de marketing da fundação e instituto, também disse à Fox News Digital que o presidente Reagan era um homem de “fé profunda”. “Certa vez, ele perguntou se resolveríamos ensinar, aprender e tentar dar ouvidos à maior mensagem já escrita: a Palavra de Deus e a Bíblia Sagrada”, disse Giller. “Ele disse que dentro das páginas da Bíblia estão todas as respostas para todos os problemas que o homem já conheceu.”
“O Pergaminho, conhecido como 4Q41, foi descoberto em 1952 na Caverna 4 de Qumran e contém Deuteronômio 8:5-10 e Deuteronômio 5:1–6:1. Acredita-se que seja a cópia mais antiga existente dos Dez Mandamentos”, observa o comunicado de imprensa da biblioteca.
“Portanto, guardarás os mandamentos do Senhor teu Deus, andando nos Seus caminhos e temendo-O”, diz a versão King James de Deuteronômio 8:6.
Para a exposição especial dos Pergaminhos dos Dez Mandamentos, a biblioteca terá horário estendido durante o período de duas semanas, com um número limitado de 1.600 ingressos alocados por dia, informou a organização à Fox News Digital.
Por apenas duas semanas, a partir de 11 de abril, a Reagan Library and Museum em Simi Valley, Califórnia, está exibindo o Ten Commandments Scroll, exibido pela primeira vez no Golden State. Ele não estava nos EUA desde 2013. (The Reagan Library)
“De acordo com as narrativas bíblicas em Êxodo e Deuteronômio, Deus revelou os Dez Mandamentos a Moisés no Monte Sinai, inscrevendo-os em tábuas de pedra como princípios orientadores para a comunidade. Esses mandamentos permanecem centrais para as religiões abraâmicas e continuam a influenciar tradições morais e legais em todo o mundo.”
A exposição completa dos Manuscritos do Mar Morto se estende até 2 de setembro de 2025. (The Reagan Library)
Evidências arqueológicas sugerem também presença de soldados egípcios e mercenários
Novas descobertas arqueológicas na antiga cidade de Megido, local da lendária batalha do Armagedom, lançam luz sobre um confronto bíblico entre o rei Josias de Judá e o faraó egípcio Neco II, ocorrido há mais de 2.600 anos. Josias foi um dos últimos reis de Judá, conhecido por sua devoção a Deus e pelas reformas que implementou, buscando restaurar o culto ao Criador e eliminar práticas idólatras. Segundo a Bíblia, ele morreu ao enfrentar o exército egípcio em Megido. O termo Armagedom, derivado do hebraico “Har Megiddo” (Monte Megido), aparece no livro do Apocalipse como o local da batalha final no fim dos tempos.
A recente descoberta arqueológica em Megido reforça a veracidade dos relatos bíblicos, ao confirmar a presença de forças egípcias na região na época da morte de Josias. Um estudo recente, publicado no The Scandinavian Journal of the Old Testament, revela a presença de um exército egípcio em Megido por volta de 609 a.C., data em que a Bíblia relata a morte de Josias.
A análise de fragmentos de cerâmica egípcia e grega, encontrados em uma camada arqueológica da época, indica que Megido foi ocupada pelos egípcios, que frequentemente utilizavam mercenários gregos em suas tropas.
O estudo foi liderado por Israel Finkelstein, arqueólogo da Universidade de Haifa e da Universidade de Tel Aviv. Segundo ele, a presença de cerâmica egípcia e grega no local indica que tropas egípcias, possivelmente acompanhadas por mercenários gregos, ocuparam Megido na época do reinado de Josias.
“Esses achados apoiam a ideia de que forças egípcias estavam em Megido durante o período descrito na Bíblia”, explicou Finkelstein.
A cidade, estrategicamente importante por sua localização em rotas comerciais e militares, foi palco de diversas batalhas ao longo da história, sendo ocupada por diferentes povos.
As escavações em Megido revelaram mais de 20 camadas arqueológicas, abrangendo períodos de ocupação cananeia, israelita, assíria, egípcia e persa.
O local, palco de incontáveis batalhas ao longo dos séculos, continua a revelar segredos que conectam o passado ao futuro. Uma cidade estratégica que já foi disputada por impérios e reis agora ressurge como evidência arqueológica de eventos bíblicos. Para a história e para a fé, um campo de guerra e o prenúncio da batalha definitiva.
O americano William Albright, uns dos maiores arqueólogos bíblicos de todos os tempos, costumava dizer: “A arqueologia não pode, e não pretende, provar milagres. Nosso objetivo é, por meio de novas descobertas, reconstruir a realidade histórica de tempos remotos.” A ideia se aplica perfeitamente à história de Moisés, o personagem mais notável e enigmático do Antigo Testamento. A epopeia que, segundo as Escrituras, o líder dos hebreus comandou para tirar seu povo do cativeiro egípcio e levá-lo à terra prometida inclui passagens fenomenais, como a travessia do Mar Vermelho, as dez pragas que assolaram o Egito e as tábuas da lei, com os dez mandamentos, que Moisés recebeu das mãos do próprio Criador. Como disse Albright, os milagres jamais serão provados – aceitá-los ou contestá-los será sempre uma questão de fé. Mas as controvérsias não são poucas. Até hoje, não se sabe ao certo se o Êxodo teria acontecido por volta de 1250 a.C. ou 200 anos mais tarde. Também não há nada que comprove se o Monte Sinai, no Egito, teria sido o local onde Moisés teria recebido as Tábuas da lei. Mas achados arqueológicos lançam um foco de luz sobre a vida desse obscuro personagem [sic].
Narrada no livro de Êxodo, a história mostra os hebreus escravizados no Egito e sua peregrinação para Canaã. Os críticos da Bíblia dizem não haver nenhum vestígio do cativeiro egípcio. Não é verdade. Uma ilustração gravada nas rochas de uma caverna no sul do Egito, por volta de 1450 a.C., mostra soldados de pele escura supervisionando o trabalho de homens de pele mais clara, vestidos de tangas de linho. A obra foi feita por ordem de um vizir – espécie de ministro – do faraó Thutmoses, que, acreditam alguns estudiosos, teria sido o soberano do Egito à época de Moisés. “É evidente a relação que a figura faz dos egípcios, de pele mais escura, com os hebreus, mais claros”, observa Oséias Moura, doutor em Antigo Testamento pela PUC do Rio de janeiro.
Outra descoberta que remete ao suposto cativeiro egípcio é o túmulo de Amose, comandante do exército de faraó. Nas paredes da tumba, numa vila nos arredores de luxor, os arqueólogos encontraram inscrições que falam da família e das conquistas do general egípcio. Depois de relatar suas vitórias sobre exércitos inimigos, Amose inseriu uma lista de alguns dos seus escravos. A maior parte deles tinha nomes tipicamente hebreus, como Mara, Miriam e Putiel.
Até algumas das pragas que Deus teria derramado sobre o Egito, para forçar faraó a libertar os hebreus, já foram trazidas à luz pela arqueologia. O papiro de Ipuwer, sacerdote egípcio, é um registro pessoal de suas preces ao deus Hórus. No texto escrito em demótico – o egípcio cursivo – e datado de cerca 1350 a.C., Ipuwer reclama: “O rio transformou-se em sangue, nossos animais estão morrendo. As plantações não produzem. A escuridão cobriu a terra.” Essas pragas são umas das dez que, segundo o livro do Êxodo, Deus lançou sobre o Egito. O achado mudou o posicionamento de muitos estudiosos que se referiam às pragas como pura ficção. “Eles passaram a acreditar que as pragas fizeram parte de uma grande catástrofe ambiental, que teria devastado a região do Rio Nilo naquela época”, diz Rodrigo Silva.
Deixando o campo minado dos milagres, um achado especial marcou a história da arqueologia bíblica e pode até posicionar Moisés e Êxodo na linha do tempo. Em 1896, nas proximidades de Tebas, no Egito, foi encontrada a Estela (uma placa de pedra) do faraó Merneptah, datada ano 1220 a.C. A peça traz uma lista das vitórias de Merneptah sobre povos inimigos. Israel é um desses povos. É a mais antiga referência não bíblica a Israel já encontrada. Entre outras citações, o texto diz: “A Líbia está devastada, Israel está aniquilado e suas sementes não mais germinarão.” Os sinais utilizados na inscrição sugerem Israel como pessoa ou povo, e não como lugar, como defendem alguns estudiosos.
“Os Dez Mandamentos”, “O Príncipe do Egito”, “Êxodo: Deuses e Reis”. Enquanto os dois primeiros filmes foram lançados em épocas em que o ceticismo contra o relato bíblico ainda era confinado às universidades e a poucos segmentos da sociedade, a mais recente versão da história bíblica do Êxodo surgiu como mais um ingrediente no debate envolvendo religião, violência, mitologia e antagonismo bíblico. O texto abaixo é uma reação à matéria de capa da revista Superinteressante de janeiro de 2015, sobre o principal evento da nação israelita, como registrado nas páginas sagradas. Antes de mais nada, devo parabenizar o autor da matéria pela maneira clara e descontraída com que descreveu a história do Antigo Oriente. Apesar de não concordar com muitas das opiniões dele sobre o Antigo Testamento, como será demonstrado abaixo, isso não tira o mérito de Alexandre Versignassi pelo seu texto. Porém, apresento aqui dois problemas metodológicos do articulista. Primeiro, em linhas gerais, ele traduziu para um português bem claro a chamada “hermenêutica da dúvida”, que sempre trata o texto bíblico “culpado, até ser provado inocente”. Isso porque muitos acadêmicos confundiram leitura crítica com leitura cética. Lidar com um texto antigo com o ceticismo do século 21 não é a melhor abordagem metodológica. E não estou falando do sobrenatural. Estou falando de uma reconstrução histórica do ambiente que o relato bíblico supostamente descreve. Por que não lidar com o texto antigo desta forma: “Inocente, até ser provado culpado”?
Em segundo lugar, o autor cita dois acadêmicos para falar sobre Israel no Antigo Testamento, Richard Freedman e Israel Finkelstein. Isso é para lá de tendencioso. Seria o mesmo que pedir para os líderes do Hamas e do Hezbollah opinarem sobre Israel e EUA. Não há como esperar uma visão equilibrada sobre o Êxodo e o surgimento da nação Israelita da parte deles. Não estou desqualificando o trabalho dos dois, o que estou dizendo é que existem opiniões diferentes e que deveriam também ser ouvidas e contrastadas.
Um deles é meu professor, James K. Hoffmeier, egiptólogo formado pela Universidade de Toronto, no Canadá. Dois dos seus livros lidam diretamente sobre o assunto: Israel in Egypt (1996) e Ancient Israel in Sinai (2005), ambos publicados pela Oxford University Press. Além de professor de Antigo Testamento, Hoffmeier leciona Egípcio Antigo há mais de 30 anos, o que lhe permite falar naturalmente sobre condições políticas, econômicas e militares do período do Reino Novo do Egito (Dinastias 18-20), a época em que a Bíblia situa o Êxodo.
Outro acadêmico que deu inúmeras contribuições para o estudo do Antigo Oriente e Antigo Testamento é Kenneth Kitchen, egiptólogo aposentado da Universidade de Liverpool, na Inglaterra. Seu domínio em mais de 15 línguas do Antigo Oriente lhe permite falar como ninguém sobre o dia a dia das cortes, dos templos e fortes militares durante a Idade do Bronze e do Ferro. Ele, inclusive, aprendeu português com a única finalidade de publicar o texto dos monumentos (estelas) de Ramsés II que estão no Museu do Rio de Janeiro, já que ele é uma respeitada autoridade no período Ramessida. E imagine só: tanto Kitchen como Hoffmeier são cristãos evangélicos! Eles não usam as publicações para converter pessoas ao cristianismo, mas, sim, para apresentar uma visão equilibrada sobre o mundo do Antigo Oriente e as páginas do relato bíblico.
Num debate intelectual, cristãos geralmente são chamados de preguiçosos. Fica aqui uma simples comparação: em seu livro E a Bíblia não Tinha Razão, Israel Finkelstein gastou 24 páginas para falar sobre o Êxodo, com onze sugestões de leitura sobre o assunto no fim do livro. Numa obra com a mesma temática, Kitchen escreveu 72 páginas e com um total de 145 notas de rodapé. Quantos leram as páginas de Finkelstein? Quantos leram o que Kitchen escreveu? Não tenho números exatos, mas sem dúvida a sede por informações rápidas e condensadas da nossa geração prefereriria o que Finkestein escreveu, e o pior, não se daria ao trabalho de ler opiniões contrárias.
A ausência de evidências diretamente relacionadas com Moisés, os israelitas e o Êxodo bíblico é a avenida principal para o ceticismo – ingênuo, eu diria – de muitos historiadores, curiosos no assunto, e até mesmo teólogos bíblicos, principalmente aqueles que gastam mais tempo estudando teorias literárias sem fundamento e esquecem de olhar o mundo ao redor do Antigo Testamento. Existem pelo menos três motivos pelos quais não disposmos de tais evidências:
Primeiro, o contexto geográfico de Êxodo 1–14 é a região do Delta do Nilo, uma região que por milênios tem acumulado lama das inundações anuais do Nilo. Estruturas de tijolos de barro tinham duração limitada e eram repetidamente substituidas por outras, devido a essas inundações. Afirmar que “nenhuma evidência dos israelitas no Egito jamais foi encontrada” é muitas ingênuidade, e esperar por essas evidências é perda de tempo. Até mesmo estruturas de pedra dificilmente foram preservadas na região.
Segundo, a situação se torna mais drástica quando se pensa em papiros. Na lama, 99% dos papiros desaparecem para sempre. Apenas um pouco dos papiros da região oriental do delta foi recuperada no deserto próximo a Mênfis.
Terceiro, faraós não registravam suas derrotas. Eles jamais deixariam um monumento ou registro nas paredes de um templo relatando a rebelião de um grupo de escravos que resultou na perda de carruagens e soldados, como na história bíblica do Êxodo. Os textos egípcios sobre a batalha de Qadesh, por exemplo, apresentam Ramsés II como o grande vitorioso. Já a versão hitita da mesma batalha tem o rei Muwatali como vencedor.
Portanto, para “confirmar” a história bíblica, é inútil esperar evidências que não estão lá no Delta. Se, como cavalos, limitarmos nossas viseiras para o pouco que a arqueologia pode trazer à luz, então não há nada a ser dito sobre o Êxodo. Há necessidade de uma abordagem mais contextual, tanto do relato bíblico como do ambiente histórico que ele supostamente descreve.
Dito isso, apresento abaixo algumas considerações sobre a matéria da Super:
“Os israelistas nao foram escravos e nunca migraram para o Egito”: o chamado Segundo Período Intermediário da história Egípcia (Ca. 1650-1550 a.C.) encaixa-se bem nas descrições da história de José, no fim do livro de Gênesis, e do primeiro capítulo de Êxodo. Os hekau khasut, também conhecidos como Hyksos, estavam dominando a região do Delta do Nilo. Eles eram de origem siro-palestina. Anterior a esse período, temos o famoso painel de Beni Hassan, que descreve um semita chamado Absha (ou Ibsha) chegando ao Egito com seu grupo de 37 pessoas e entregando seu “visto” em um dos pontos de imigração. Sendo assim, imaginar um grupo de aproximadamente 70 pessoas, a família de Jacó, entrando no Egito na mesma época, não é nenhum problema do ponto de vista histórico. Também dispomos de ilustrações de trabalho escravo no período da 18ª dinastia, exatamente o período em que o poder voltou para as mãos dos egípcios que reinavam a partir de Tebas, com uma política fortemente anti-hyksos, porque não antissemita. Numa das pinturas da tumba de Rekhmire, um vizir (i.e. primeiro ministro), é possível ver prisioneiros de guerra semitas e núbios fazendo tijolos. Em suma, não precisamos de uma fé extraordinária para imaginar grupos de semitas indo para o Egito e, depois de um tempo, se depararem com uma mudança radical nas políticas internas e enfrentar trabalho escravo.
Foto 1 –Mural de Beni Hassan: semitas entram no Egito
O número dos israelitas: somos informados de que o número de israelitas que saíram do Egito era de 600 mil homens, sem contar mulheres e crianças (Êx 12:27). Como o articulista calculou, adicionando uma esposa e uma criança para cada homem, temos quase dois milhões de pessoas. E aqui temos um grande problema. Há informações detalhadas sobre o exército egípico no período do Reino Novo. Era um total de aproximadamente 25 mil soldados, de acordo com Anthony Spalinger, uma das principais autoridades no assunto. A população egípcia era de aproximadamente dois a três milhões de pessoas. Se os israelistas fossem uma nação tão grande assim, eles não precisariam de um Moisés ou de Deus para libertá-los. Eles poderiam sair a hora que bem entendessem! Em lugar de descartar a informação bíblica, seria bom tentar entendê-la melhor. O que significa a palavra “mil” (heb. ‘eleph)? Ela pode significar unidade de mil pessoas, unidade militar ou pelotão, líder de um grupo, clã e tribo. Em algumas passagens do Antigo Testamento em que ela é utilizada, o significado “mil” não parece ser uma boa opção. Por exemplo, 2 Reis 13:7 menciona 50 cavalheiros, 10 carruagens e 100 mil soldados! Esse é um número discrepante, comparado com os dois anteriores. Em 1 Reis 20:29, 30, vinte e sete “mil” soldados foram mortos porque uma parede caiu sobre eles! Essa deveria ser uma parede enorme.
Kitchen, Hoffmeier e outros acadêmicos sugerem que ‘eleph, no contexto das passagens do Êxodo, deve ser entendido como um “pelotão” ou “líder militar”; e de acordo com a correspondência diplomática do faraó Akhenaten e reis de Canaã e Síria, as chamadas cartas de Amarna, um pelotão tinha nove soldados. Seiscentos líderes de pelotões ou unidades militares com nove soldados cada um são 5.400 homens.
Atribuindo uma esposa e alguns filhos para cada um, temos aproximadamente 20 a 22 mil israelitas saindo do Egito. Sendo que a população de Canaã durante a Idade do Ferro (Ca. 1150 a.C.) era de 50 a 70 mil, esse número de israelitas se encaixa muito bem com o que se conhece por meio de estudos arqueológicos em Israel. Apenas a título de ilustração, a maior cidade de Canaã naquela época (13º século a.C.), Hazor, não era maior do que um quilômetro quadrado. As outras cidades que os israelitas conquistaram eram bem menores do que ela. Uma população de dois milhões de israelitas certamente deixaria um rastro muito claro e impossível de não ser notado em escavações feitas em Israel.
Note que não se trata de acreditar ou desacreditar o relato bíblico, mas, sim, de entendê-lo corretamente à luz de sua língua original e do seu contexto histórico.
Origens de Israel: esse é um dos tópicos mais discutidos em simpósios e fóruns bíblicos ao redor do mundo. Não temos espaço para discutir o assunto em um parágrafro, mas basta dizer que existem basicamente três teorias para a origem de Israel em Canaã: (1) o modelo bíblico da “conquista”, como numa leitura equivocada e exagerada do livro de Josué; (2) tribos nômades entrando naquele território pela região da Transjordânia, a região à direita do rio Jordão; e (3) Israel nunca saiu da “Terra Prometida”, eles se originaram e se desenvolveram lá. Uma quarta teoria tem sido defendida por Finkelstein, afirmando que os israelitas eram pastores cananeus que sempre viveram ali na região.
Se Israel se originou em Canaã, como o articulista sugere, e não de uma saída em massa do Antigo Egito, por que diversos elementos da religião israelita tinham um curioso reflexo da religião egípcia? O tabernáculo no deserto (Êx 25–40), por exemplo, segue o mesmo modelo da tenda de Ramsés II em suas campanhas militares, e os utensílios desse tabernáculo portátil, a arca da aliança, o candelabro, o altar de incenso, as cortinas, entre outros, têm uma clara influência egípcia.
Se Israel se originou em Canaã, por que a vemos proibição do porco na dieta israelita (Lev. 11), algo facilmente verificável em restos arqueológicos, enquanto os filisteus tinham carne suína como parte fundamental de sua dieta? Porcos eram considerados impuros no Antigo Egito, e até mesmo chamados de bw, abominar, detestar, ou bwt, abominação. Existem elementos na cultura e na religião israelita que não são explicados pela teoria de Finkelstein apresentada na Super.
Yahweh e as origens do monoteísmo: vemos traços de monoteísmo no Antigo Egito muito antes do polêmico faraó Akhenaten. No chamado “Hino a Atum” (Ca. 1500/1400 a.C.), Amun-Re é exaltado como criador de outros deuses e da humanidade. O conteúdo do hino parece ser mais antigo, tendo sido preservado em uma estátua produzida entre as 13ª e 17ª dinastias (Ca. 1790–1540 a.C.), muito próximo da época dos patriarcas. Por falar neles, Abraão, Isaque e Jacó usam os nomes divinos El e Yahweh de maneira intercambiável. Afirmar que o nome El é reflexo de influências pagãs na religião israelita pode ser uma conclusão apressada, já que nas narrativas patriarcais existe ausência de qualquer adoração a Ba’al, um deus que também fazia parte do mesmo panteão de que El era o líder. Quanto a Yahweh (ou Javé) ser uma divindade vinda de Midiã, realmente existem diversos poemas antigos no Antigo Testamento que parecem sugerir isso (Juízes 5; Habacuque 3, etc.), e o fato de Moisés ter passado boa parte de sua vida adulta ali parece favorecer a ideia de que o libertador israelita tenha aderido ao culto a Yahweh ali. O tópico é controverso, mas por que não considerar esses textos como uma descrição poética da marcha militar de Yahweh e dos israelitas saindo do Egito e passando por Midiã rumo a Canaã? Por que eles precisariam necessariamente ser uma declaração da origem do culto a Yahweh?
“Êxodo” na época da invasão dos “povos do mar”: a sugestão apresentada por Versignassi que o “Êxodo” na verdade foi a fuga de poucos escravos cananeus numa época onde o exército egípcio estava ocupado demais tentando proteger as fronteiras do império é interessante, mas requer uma grande ginástica histórica. Ramsés III lutou contra os “povos do mar”, entre eles os conhecidos filisteus, em 1180 a.C., logo no começo do seu reinado. Alguns anos antes, o faraó Merneptah deixou registrado um documento comemorativo (estela) de suas campanhas em Canaã, no qual ele menciona pela primeira vez um grupo étnico que ele chama de “Israel” e que vivia ali por volta de 1207 a.C. Nesse documento, Israel é descrito como um grupo nômade vivendo em Canaã, e essa é exatamente a informação que temos de Israel no livro de Juízes. Um povo sem rei e sem uma capital; apenas um centro religioso onde o tabernáculo estava localizado, Siló. Mas em vez de de se manter com esse cenário bem fundamentado, o articulista está pressupondo a teoria de Finkelstein de que os israelitas se originaram em Canaã, uma teoria que está longe de ser unanimidade nos círculos arqueólogicos.
Foto 2:Estela do faraó Merneptah
Abertura do “Mar Vermelho”: “Mar Vermelho” é uma tradução baseada na versão grega do Antigo Testamento, a Septuaginta (LXX). O texto hebraico de Êxodo simplesmente traz “mar de juncos” (heb. yam suph), região também conhecida em textos egípcios do Reino Novo como pa tufy, como sugerido pelo arqueólogo austriáco Manfed Bietak. Se reunirmos as coordenadas geográficas e os nomes dos lugares (topografia) mencionados em Êxodo 12:37 e 14:1-9 e compararmos com a documentação egípcia obtida nas inscrições de Seti I, pai de Ramsés II, no Templo de Karnak, em Luxor, podemos localizar com segurança o “mar vermelho”. Tradicionalmente pensa-se que este seria o Golfo de Suez, entre o Egito e a Península do Sinai. Na verdade, trata-se dos lagos el-Ballah, que não existem mais desde que o canal de Suez foi feito no século 19. Estudos naquela região em 1995 revelaram um porto no qual barcos ficavam estacionados. Ele tinha aproximadamente 15 km de extensão e uma profundidade de três metros. Seria perfeitamente possível comparar tamanha quantidade de água com um muro à esquerda e à direita dos israelitas (Êx 14:22).
Foto 3 – A proposta rota do Êxodo está marcada em vermelho. O “Mar Vermelho” são os lagos El-Ballah, no lado direito do mapa
Esse é o principal aspecto sobrenatural da história e é aqui que os céticos se apegam para desmentir todo o relato do Êxodo. Essa é outra discussão. Bastaria dizer por agora que ninguém no Antigo Oriente colocava uma roupagem histórica num mito para lê-lo como uma história real. Se você compartilha de uma visão de mundo onde Deus é real e Ele é o Criador, eventos miraculosos não são um problema, afinal é Ele quem governa toda a Sua criação.
Hoffmeier apresentou recentemente duas palestras sobre a geografia do Êxodo e as diversas teorias que circulam na internet. Uma delas foi com o geólogo Stephen Moshier. Você pode ter acesso a elas aqui e aqui. Vale a pena também ler um artigo publicado há alguns anos neste blog pelo Dr. Rodrigo Silva (confira).
Levitas: a teoria de que os levitas foram o único grupo que esteve no Egito não é nova. Desde muito cedo, acadêmicos reconheceram a presença de nomes egípicios entre alguns membros dessa tribo. Se esse é o argumento, deveríamos incluir a tribo de Naftali, já que um dos seus líderes se chamava Ahira, uma combinação das palavras “amigo” e “Rá”, em hebraico e egípcio, respectivamente (Nm 1:15; 2:29; 7:78; 8:3; 10:27). Também deveríamos incluir a tribo de Judá, já que Hur, que ajudou Moisés a manter seus braços erguidos numa batalha contra os amalequitas, muito provavelmente é o nomedo deus egípcio Hórus (hr). Recentemente, outro acadêmico, Richard Hess, fez um estudo dos nomes daqueles que saíram do Egito e a conclusão dele é a de que são nomes de várias etnias (egípcios, semitas, hititas e hurritas), no mesmo período do Êxodo, fortalecendo o relato bíblico que afirma que um “misto de gente” saiu do Egito com os israelitas. (Êx 12:38).
Leis do Pentateuco: a opinião quase generalizada de biblistas treinados única e exclusivamente em hebraico, e treinamento amador nas línguas do Antigo Oriente, é que o Pentateuco foi escrito na época do rei Josias, rei de Jerusalém, no sétimo século a.C., e não na época de Moisés. Mas os mesmos biblistas parecem se esquecer de que códigos eram comuns no Antigo Oriente, entre eles os textos sumerianos das leis de Ur-Nammu (2100 a.C.), Lipit-Ishtar (1930 a.C.), e o famoso código de Hamurabi (1780 a.C.), escrito em acadiano. A estrutura do livro de Deuteronômio, por exemplo, é idêntica à de tratados entre um suzerano e seus vassalos do século 13 a.C., muito comuns no Antigo Oriente, na época de Moisés e dos israelitas que saíram do Egito, não na época do rei Josias. Colocar a produção do Pentateuco na época desse rei é o mesmo que ignorar a vasta literatura do Antigo Oriente, disponível para ser comparada.
Escravidão: escrevi sobre escravidão no Antigo Testamento em resposta a outra matéria do mesmo autor (confira aqui). Se você assitiu ao recente filme “12 anos de escravidão”, deve se lembrar de uma cena em que o dono de uma fazenda começa o dia de trabalho lendo um trecho de Êxodo 21 para seus escravos negros. É inegável que muitas atrocidades foram cometidas em nome do cristianismo, apesar de seu Fundador jamais sancioná-las. Mas a pergunta é: O texto bíblico estava realmente autorizando essas práticas? No caso da escravidão, aí vão alguns breves comentários à luz de Êxodo 21:1-11: (a) por escravidão, entenda servidão. O trabalho de seis anos era para pagar dívidas; (b) o texto aparentemente sugere que a escravidão separava famílias, já que após o período de trabalho o homem deixaria a esposa e os filhos, caso houvesse começado solteiro seus seis anos de trabalho. Em outra passagem em que a mesma lei é repetida, é-nos dito que mulheres também estavam sujeitas ao mesmo período de trabalho (Dt 15:12). Ou seja, a mudança no status matrimonial não anulava o contrato de trabalho de seis anos. A esposa, que também seria escrava, teria que cumprir o período de servidão.
Essa foi a primeira lei que Deus deu aos israelitas após o pronunciamento dos Dez Mandamentos (Êx 20). Se você ler atentamente esse texto (Êx 21:1-11), vai notar a constante repetição de um verbo: “sair”. Esse é o mesmo verbo utilizado para falar da “saída” (Êxodo) dos israelitas. Em outras palavras, o Legislador de Israel, Yahweh, estava dizendo: vocês tiveram um êxodo como escravos, agora seus servos também devem ter um.
Conclusão
Quando convocado a deixar os israelitas saírem do Egito, faraó respondeu prepotentemente: “Quem é o Senhor para eu Lhe ouça a voz e deixe ir a Israel? Não conheço o Senhor, nem tampouco deixarei ir a Israel” (Êx 5:2). Sendo assim, Yahweh fez questão de se revelar a ele mostrando a impotência da religião egípcia. Diversos textos egípcios falam do “braço forte” de faraó, mas ironicamente o Deus hebreu usa essa expressão para falar do Seu poder. Por meio de um simples cajado de pastor Ele fez Seus grandes atos na terra do Egito, não com os cetros carregados de simbolismo e poderes mágicos usados pelo faraó. Nessa guerra entre Deus e um rei com complexo de divindade, faraó finalmente descobriu quem era Yahweh.
Numa era marcada pela mesma arrogância faraônica diante da existência de Deus, a história da libertação dos israelitas do Egito é um constante lembrete para nossa geração do perigo da exaltação do poder e da capacidade humanos. Ao invés de “Deuses e Reis”, a história bíblica é entre um Deus e um rei arrogante. Verseginassi diz ser grato aos israelitas pelas grandes histórias e pelos filmes. Creio que a história do Êxodo nos oferece algo mais importante para sermos gratos. Ela nos lembra da inutilidade do orgulho humano diante de um Ser mais poderoso.
(Luiz Gustavo Assis é teólogo e doutorando em Bíblia Hebraica, pastor da Igreja Adventista de Anaheim, Califórnia; texto produzido com exclusividade para o blog http://www.criacionismo.com.br)
De vez em quando, alguém pergunta o que exatamente Deus teria feito para efetuar o milagre do retrocesso de 10 graus na sombra no relógio de sol de Acaz (2 Reis 20:11). Temos alguma pista sobre isso?
O caso é bastante semelhante ao do dia longo de Josué, o qual, segundo evidências arqueológicas, foi um fenômeno mundial, pois correspondeu a uma noite longa nas Américas. Isso indica que a Terra parou de girar no caso de Josué e chegou a retroceder no caso de Acaz. Um contra-argumento comum é o de que um fenômeno assim seria catastrófico a ponto de provavelmente eliminar a vida na Terra. Para ter uma ideia em miniatura do problema, basta imaginar um carro viajando em alta velocidade por uma estrada e tendo sua velocidade reduzida a zero muito rapidamente ao bater contra uma rocha. O carro provavelmente seria destruído e seus ocupantes obviamente morreriam no processo. Portanto, alguma outra coisa deve ter ocorrido tanto no caso do relógio de Acaz quanto no dia longo de Josué, certo. Na verdade, esse é um argumento falacioso (enganoso).
Usaremos de um certo abuso de linguagem para tornar a explicação mais acessível.
Aproveitemos a analogia do carro para examinar o problema um pouco mais de perto em uma situação menos extrema. Imagine o carro viajando a uma velocidade de, digamos, 100 km/h. Quando o freio é acionado, ele faz com que surja uma força (torque, mais precisamente) que tende a fazer com que as rodas parem de girar. Por causa do atrito entre os pneus e a estrada, o efeito final é que o carro é afetado por uma força em sentido contrário a seu deslocamento, causando uma “desaceleração” (uma aceleração em sentido contrário ao do movimento).
Por causa da inércia (tendência natural a permanecer no mesmo estado de movimento), os ocupantes do carro tendem a continuar viajando com a mesma velocidade ao passo que o veículo tende a deslocar-se cada vez mais lentamente. Isso dá às pessoas a sensação de serem impulsionadas para a frente, pois sua percepção baseia-se no referencial do carro. Mesmo de olhos fechados, os ocupantes podem saber quando o carro aumenta ou diminui sua velocidade por causa desse efeito de inércia. Se a alteração de velocidade for muito abrupta, o resultado pode ser fatal. A causa do problema está nas forças que as partes do veículo impõem umas sobre as outras e sobre os passageiros. Isso ocorre porque a força de frenagem ou de aumento de velocidade é aplicada a uma parte do veículo e então transmitida, por meio dela a todas as demais partes bem como aos ocupantes. Se essas forças forem suficientemente grandes, podem destruir tudo.
O que aconteceria se a mesma aceleração aplicada ao eixo das rodas também fosse aplicada a cada partícula do veículo e de seus ocupantes? Nesse caso, não haveria tensão entre partes do veículo nem entre elas e os ocupantes. De fato, seria impossível perceber a aceleração sem observar o ambiente externo ao carro. A aceleração poderia ser altíssima ou muito baixa e os ocupantes do veículo não sentiriam a diferença.
Para frear ou acelerar um carro dessa maneira, seria necessário um “campo de forças” ou, mais precisamente, um campo de acelerações. Pode parecer ficção científica, mas a gravidade funciona exatamente assim. Um carro sobre uma rampa a uma velocidade suficientemente alta, ao terminar a subida, pode perder contato com a rampa e ter sua componente vertical da velocidade freada rapidamente pela gravidade sem que isso faça com que os ocupantes do veículo sejam projetados violentamente para o teto. Apenas tendem a acompanhar naturalmente o movimento do carro, uma vez que a mesma aceleração da gravidade que atua sobre o veículo, atua também sobre eles. Nenhum efeito catastrófico ocorre a não ser quando batem no solo.
Campos gravitacionais também podem atuar de outras maneiras. Existe, por exemplo, o efeito Lense-Thirring, previsto em 1918: um objeto com grande massa e em alta velocidade de rotação pode “arrastar” o espaço ao seu redor induzindo movimentos tangenciais em objetos ao seu redor, fazendo com que órbitas em torno do objeto central sofram precessão.
Após esse passeio por noções de Física básica, podemos voltar nossa atenção ao problema do relógio de Acaz e o do dia longo de Josué. Se o torque aplicado para deter ou mesmo inverter a rotação da Terra fosse aplicado na forma de um campo que afeta cada partícula da mesma forma, não haveria qualquer efeito perceptível a não ser a alteração no movimento em relação a referenciais externos. E Deus poderia fazer isso sem violar qualquer lei física.
(Eduardo Lütz é bacharel em Física e mestre em Astrofísica Nuclear pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
Arqueólogos acreditam que este nicho representa os restos do trono de Herodes Antipas. A partir daqui, a decisão de executar João Batista pode ter sido tomada. (Crédito da imagem: Győző Vörös)
Arqueólogos afirmam ter identificado a pista de dança mortal onde João Batista — um pregador itinerante que previu a vinda de Jesus — foi condenado à morte por volta de 29 d.C. A Bíblia e o antigo escritor [judeu] Flávio Josefo (37-100 d.C.) descrevem como o rei Herodes Antipas, filho do rei Herodes, havia executado João Batista. Flávio especificou que a execução ocorreu em Maquiaéreos, um forte perto do Mar Morto na atual Jordânia.
Herodes Antipas temia a crescente influência de João Batista entre a população e assim ele o executou, escreveu Josefo. A Bíblia, por outro lado, conta de modo muito mais elaborado, alegando que Herodes Antipas mandou executar João Batista em troca de uma dança.
A história bíblica afirma que Herodes Antipas estava prestes a se casar com uma mulher chamada Herodias, e ambos eram divorciados, algo a que João Batista se opôs. Em seu casamento, a filha de Herodias, chamada Salomé, fez uma dança que tanto encantou Herodes Antipas que o rei prometeu tudo o que ela quisesse como recompensa. Salomé, instigada por Herodias, pediu a cabeça de João Batista. Herodes Antipas estava relutante em conceder o pedido, de acordo com a Bíblia, mas ele finalmente decidiu cumpri-lo e a cabeça de João Batista foi trazida para Salomé em uma bandeja.
Um pátio descoberto em Maquiaéreos é provavelmente o lugar onde a dança de Salomé foi realizada e onde Herodes Antipas decidiu decapitar João Batista, escreveu Győző Vörös, diretor de um projeto chamado Escavações e Pesquisas de Maquiaéreos no Mar Morto, no livro Arqueologia da Terra Santa em ambos os lados: Ensaios arqueológicos em honra de Eugenio Alliata (em tradução livre; Fondazione Terra Santa, 2020). O pátio, disse Vörös, tem um nicho em forma de apsidal que provavelmente sejam os restos do trono onde Herodes Antipas se sentou.
Uma reconstrução da cidadela superior de Maquiaéreos. (Crédito da imagem: Győző Vörös)
A equipe arqueológica vem reconstruindo o pátio e publicou várias imagens no livro mostrando como era na época da execução de João Batista. […]
“Uma estrela procederá de Jacó e um cetro subirá de Israel.”
ASPECTO ASTRONÔMICO: “Se você olhar para o céu hoje, notará dois pontos brilhantes, de coloração amarelada, deslocados um pouco para o oeste. Pois bem, esses dois pontos brilhantes são os planetas Júpiter (o mais brilhante) e Saturno (o menos brilhante). Por serem planetas, eles não estão fixos. Ao contrário, movimentam-se ao redor do Sol, assim como a Terra. Com o passar das noites você perceberá que eles se deslocam gradativamente pelo céu. É justamente por conta desse deslocamento que, algumas vezes, em razão do nosso ângulo de vista aqui da Terra, eles acabam se alinhando ou aparentando estarem muito pertinho um do outro, chegando ao ponto de parecerem um único objeto bastante brilhante. É exatamente isso que vai ocorrer na noite de Natal! Júpiter e Saturno, observados aqui da Terra, estarão bem pertinho um do outro, fazendo-os parecer uma estrela muito brilhante, ao oeste. Esse fenômeno se chama “conjunção planetária”. É um evento astronômico relativamente comum e pode envolver diversos corpos celestes, como a própria Lua. Portanto, nada de estrela! São dois PLANETAS que estarão muito próximos um do outro, no céu. Apenas isso!” (Skynews Astronomia)
ASPECTO RELIGIOSO: Sobre a estrela de Natal, primeiramente é bom deixar claro que Jesus não nasceu em 25 de dezembro, mas, provavelmente, durante o período da Festa dos Tabernáculos (durante a primeira quinzena de outubro do ano 2 a.C.). A história relacionada com uma estrela em Seu nascimento vem de uma profecia de Balaão feita 1.500 anos antes: “Vê-lo-ei, mas não agora, contemplá-lo-ei, mas não de perto; uma estrela procederá de Jacó e um cetro subirá de Israel” (Números 24:17).
Críticos vêm e vão, mas “a Palavra de Deus… é permanente” (1Pe 1:22).
Segundo matéria publicada no G1 Notícias, “a saga de Moisés, o profeta que teria arrancado seu povo da escravidão no Egito e fundado a nação de Israel, tem bases muito tênues na realidade, segundo as pesquisas arqueológicas mais recentes. É praticamente certo que, em sua maioria, os israelitas tenham se originado dentro da própria Palestina, e não fugido do Egito. O próprio Moisés tem chances de ser um personagem fictício, ou tão alterado pelas lendas que se acumularam ao redor de seu nome que hoje é quase impossível saber qual foi seu papel histórico original”. [Primeiro disseram que Moisés estava alucinado; agora querem matá-lo.]
O título da matéria é altamente especulativo e sensacionalista: “Moisés pode não ter existido, sugere pesquisa.” E na dúvida, claro, optam pela não existência, já que, como diz a Bíblia, quando Cristo voltar, um dos artigos em falta na Terra será justamente a fé.
O texto prossegue: “É verdade que as opiniões dos pesquisadores divergem sobre os detalhes específicos do Êxodo (o livro bíblico que relata a libertação dos israelitas do Egito) que podem ter tido uma origem em acontecimentos reais. Para quase todos, no entanto, a narrativa bíblica, mesmo quando reflete fatos históricos, exagera um bocado, apresentando um cenário grandioso para ressaltar seus objetivos teológicos e políticos.” [Na verdade, o que a corrente liberal e os céticos não conseguem engolir são os relatos de intervenção sobrenatural de Deus na história dos hebreus, como as pragas do Egito e a abertura do Mar Vermelho, por exemplo. Assim, saem-se com a “explicação” de que houve um fato histórico acrescido de mitos exagerados. Mas, se existe um Deus que criou o Universo e é todo-poderoso (e há grandes indícios de que Ele exista), os milagres relatados nas Escrituras são perfeitamente possíveis.]
Airton José da Silva, professor de Antigo Testamento do Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (SP), resume a situação: “O Moisés da Bíblia é claramente ‘construído’. Pode até ter existido um Moisés lá no passado que inspirou o dos textos, mas nada sabemos dele com segurança. Nas minhas aulas de história de Israel, começo com geografia e passo para as origens de Israel em Canaã [antigo nome da Palestina], não trato mais de patriarcas e nem do Êxodo.” [Professor de uma arquidiocese… Com “amigos” como esses, quem precisa dos céticos?]
“Os pesquisadores dispõem há muitos anos do que parece ser a data-limite para o fim do Êxodo”, continua a matéria. “Trata-se de uma estela (uma espécie de coluna de pedra) erigida pelo faraó Merneptah pouco antes do ano 1200 a.C. A chamada estela de Merneptah registra uma série de supostas vitórias do soberano egípcio sobre territórios vizinhos, entre eles os de Canaã. E o povo de Moisés é mencionado laconicamente: ‘Israel está destruído, sua semente não existe mais.’ Não se diz quem liderava Israel nem que regiões eram abrangidas por seu território. Trata-se da mais antiga menção aos ancestrais dos judeus fora da Bíblia.”
Depois de admitir que há evidências arqueológicas a favor do relato bíblico relacionado com a história dos hebreus no Egito, o texto diz que o problema é que “não há nenhuma menção aos israelitas ou a José e sua família em documentos egípcios ou de outros reinos do Oriente Médio nessa época. Pior ainda, até hoje não foi encontrado nenhum sítio arqueológico no Sinai que pudesse ser associado aos 40 anos que os israelitas teriam passado no deserto depois de deixar o Egito”.
Mas isso é justamente o que se deveria esperar. Ou seria concebível imaginar um faraó registrando numa estela o “feito” de ter sido humilhado pelo Deus dos escravos hebreus e tê-los deixado escapar de seu reino? Como esperar registros do Êxodo em pedras por parte dos hebreus se durante os 40 anos eles foram andarilhos no deserto?
Mais um cético num centro universitário dito religioso: “Para Milton Schwantes, professor da Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, outro problema com a ligação entre os israelitas e os hicsos é dar ao Êxodo uma dimensão muito mais grandiosa do que seria razoável esperar do evento. ‘É uma cena de pequeno porte – estamos falando de grupos minoritários, de 150 pessoas fugindo pelo deserto [a Bíblia sugere mais de um milhão de pessoas; mas ela está errada e o Milton, certo…]. Em vez do exército egípcio inteiro perseguindo essa meia dúzia de pobres e sendo engolido pelo mar, o que houve foram uns três cavalos afundando na lama’.”
“O próprio nome de Moisés é um nome egípcio que os israelitas não entenderam”, diz Schwantes. Parece ser a terminação “-mses” presente em nomes de faraós como Ramsés e quer dizer “nascido de” algum deus – no caso de Ramsés, “nascido do deus Rá”. No caso do líder dos israelitas, falta a parte do nome referente ao deus. [E não devia ser assim mesmo, visto que Moisés foi adotado pela filha do faraó e, portanto, recebeu um nome egípcio?]
A matéria do G1 diz também que o hebraico Yam Suph, normalmente traduzido como “Mar Vermelho”, parece ser “Mar de Caniços”, ou seja, uma área cheia dessas plantas típicas de regiões lacustres. Assim, nas versões originais da lenda [sic], afirmam estudiosos do texto bíblico [estudiosos liberais, que sempre – e somente eles – são ouvidos nesse tipo de reportagem], os “carros e cavaleiros” do Egito teriam ficado presos na lama de um grande pântano, enquanto os fugitivos conseguiam escapar. Conforme a tradição oral sobre o evento se expandia, os acontecimentos milagrosos envolvendo a abertura de um mar de verdade foram sendo adicionados à história.
“Israel Finkelstein [sempre ele, o judeu ateu que adora descontruir a Bíblia e é incensado pela mídia unilateral], arqueólogo da Universidade de Tel-Aviv, em Israel, conta que uma série de novos assentamentos associados às antigas cidades israelitas aparecem na Palestina por volta da mesma época em que a estela de Merneptah foi erigida. Acontece que a cultura material – o tipo de construções, utensílios de cerâmica etc. – desses ‘israelitas’ é idêntica à que já existia em Canaã antes de esses assentamentos surgirem. Tudo [tudo ou somente essa associação das cerâmicas?] indica, portanto, que eles seriam colonos nativos da região, e não vindos de fora. Para Finkelstein, isso significa que a história do Êxodo foi redigida bem mais tarde, por volta do século 7 a.C. O confronto com o Egito teria sido usado como forma de marcar a independência dos israelitas em relação aos vizinhos, que estavam tentando restabelecer seu domínio na Palestina. A figura de Moisés, talvez um herói quase mítico já nessa época, teria sido incorporada a essa versão da origem da nação.”
Nota: A despeito de uma ou outra tentativa de desacreditar aspectos do relato bíblico, a História tem calado muitos críticos da Bíblia. A redação do Pentateuco por Moisés é um bom exemplo. Até pouco tempo atrás, afirmava-se que a invenção do alfabeto tinha sido feita pelos séculos XII ou XI a.C., sendo este argumento apresentado para “provar” que Moisés não podia ter escrito o Pentateuco, visto que em seu tempo não haviam ainda inventado a arte de escrever. No entanto, escavações arqueológicas um Ur, na antiga Caldéia, têm comprovado que Abraão era cidadão de uma metrópole altamente civilizada. Nas escolas de Ur, os meninos aprendiam leitura, escrita, Aritmética e Geografia. Três alfabetos foram descobertos: junto do Sinai, em Biblos e em Ras Shamra, que são bem anteriores ao tempo de Moisés (1500 a.C.).
Estudiosos modernos que vão na contra-mão de liberais como Finkelstein, sustentam que Moisés escolheu a escrita fonética para escrever o Pentateuco. O arqueólogo W. F. Albright datou essa escrita de início do século XV a.C. (tempo de Moisés). Interessante é notar que essa escrita foi encontrada no lugar onde Moisés recebeu a incumbência de escrever seus livros (Êx 17:14). Veja o que disse Merryl Unger sobre a escrita do Antigo Testamento: “A coisa importante é que Deus tinha uma língua alfabética simples, pronta para registrar a divina revelação, em vez do difícil e incômodo cuneiforme de Babilônia e Assíria, ou o complexo hieróglifo do Egito.”
Deus sempre sabe mesmo o que faz! Pense bem: se o alfabeto tivesse sido realmente inventado pelos fenícios, cuja existência foi bem posterior à de Moisés, e se as escritas anteriores – hieroglífica e cuneiforme – foram apenas decifradas no século passado, como poderia Moisés ter escrito aqueles livros? Se o tivesse feito, só poderia fazê-lo em hieróglifos, língua na qual a própria Bíblia diz que Moisés era perito (At 7:22) e, nesse caso, o Antigo Testamento teria ficado desconhecido até o século passado, quando o francês Champollion decifrou os hieróglifos egípcios. Acontece que, no princípio do século 20, nos anos de 1904 e 1905, escavações na península do Sinai levaram à descoberta de uma escrita muito mais simples que a hieroglífica, e era alfabética! Com essa descoberta, a origem do alfabeto se transportava da época dos fenícios para a dos seus antecessores, séculos antes, os cananitas, que viveram no tempo de Moisés e antes dele.
Portanto, foram esses antepassados dos fenícios que simplificaram a escrita. E passaram a usar o alfabeto em lugar dos hieróglifos, isto é, sinais que representam sons ao invés de sinais que representam ideias. Moisés, vivendo 40 anos numa região (Midiã) onde essa escrita era conhecida, viu nela a escrita do futuro, e passou a usá-la por duas grandes razões: (1) a impressão grandiosa que teve de usar uma língua alfabética para seus escritos e que se compunha de apenas 22 sinais bastante simples comparados com os ideográficos que aprendera nas escolas do Egito; (2) Moisés compreendeu que estava escrevendo para o seu próprio povo, cuja origem era semita como a dos habitantes da terra onde estava vivendo, e que não eram versados em hieróglifos por causa de sua condição de escravos.
O apóstolo Paulo diz que “toda Escritura é inspirada por Deus” (1Tm 3:16). Ou cremos nisso ou não. Selecionar textos que consideramos inspirados e outros, não, é ir contra a própria Palavra de Deus.
Críticos vêm e vão, mas “a Palavra de Deus… é permanente” (1Pe 1:22).
A propósito, segundo os evangelhos (transfiguração) e a carta de Judas, Moisés está bem vivo, no Céu. Portanto, ainda que queiram “matá-lo”, isso é um esforço inútil. [MB]
O portal G1 publicou em 2008 matéria afirmando que “os dois primeiros capítulos do livro sagrado de cristãos e judeus retratam não uma criação do mundo, mas duas. O ser humano surge de duas maneiras diferentes, uma logo depois da outra, e até o deus [sic] responsável pela criação não tem o mesmo nome nos dois relatos”. Será que há mesmo contradição nos relatos? De forma sucinta (pois uma análise dessa natureza exigiria muitas páginas), o pastor e professor Douglas Reis responde:
“Alguns setores da mídia tupiniquim fazem realmente de tudo para chamar a atenção, mormente, questionando a moral cristã, ou, o que é pior, levantando dúvidas a respeito da fonte da moral, a Bíblia Sagrada. É o caso da reportagem ‘Bíblia abriga duas versões contraditórias da criação do mundo’, que ressuscita a controversa hipótese documental.
“Para os proponentes dessa linha de pensamento, o Pentateuco não teria a autoria mosaica; ao contrário, seria uma coleção de documentos com épocas e linhas de pensamento divergentes, editados por alguém (supõe-se, geralmente, que Esdras seja o editor final) e atribuídos ao filho da filha de Faraó.
“Essa abordagem parte do pressuposto de algumas narrativas duplas encontradas em todo o Pentateuco (por ex.: Gn 1 e 2; Gn 16:4-16 e 21:8-20; Êx 20:3-17 e Dt 5:1-20, etc.). Para explicar tais duplicatas afirma-se haver diversas tradições, provenientes de grupos dentro de Israel (ou mesmo fora de Israel) que o editor não soube conciliar, optando por oferecer duas versões do mesmo episódio.
“Nem é preciso dizer que tal linha de pensamento, originária do século 19 (como reconheceu Suzana Chwarts, em uma declaração citada na reportagem), não seja novidade no ciclo acadêmico e evangélico, o que faz com que a notícia perca a sua razão de ser – afinal, para que explorar uma teoria tão debatida e já refutada, dando-lhe um fantasioso verniz de ‘uma verdade vinda à tona’?
“Numa reportagem se diz muita coisa não só pelo que se afirma, como também pelo que se omite. E é notória a omissão de Reinaldo José Lopes, autor da matéria, da opinião de estudiosos das áreas bíblicas que sejam da linha tradicional de pensamento. Por que apenas teólogos liberais são citados? Nem se chega a questionar o que eles dizem, que é elevado ao status de palavra final! Por que o jornalista omitiu as críticas a essa visão do texto bíblico? São perguntas que pairam pela mente de um leitor que conheça as questões tratadas na matéria…
“Christine Hayes, cuja opinião aparece no texto, afirma ser curioso ‘que elementos que lembram tanto a primeira quanto a segunda história da criação’ estejam presentes em outros textos da literatura antiga do Oriente Médio. ‘A imagem de deuses fazendo uma série de pequenos humanos com argila, como se fossem oleiros, também é muito comum’, prossegue ela. Obviamente, isso apenas contribui para pensarmos no valor daquilo que é narrado, uma vez que tantos povos e tão distantes entre si narrem uma criação de forma semelhante. Uma lenda se apoia em fatos históricos, acrescentando a eles um caráter místico e ampliado. Mas a existência da lenda não exclui a historicidade do evento que a originou. A narração de Os Lusíadas, por exemplo, não conspira contra a empreitada náutica do Vasco da Gama histórico, embora Camões tenha ‘enfeitado’ a narrativa com episódios inspirados na mitologia, seguindo as convenções literárias estabelecidas pelo modelo de épica herdado dos gregos.
“Semelhantemente, a criação do mundo pode ter ocorrido exatamente como descreve o Gênesis, sendo que, à medida que os povos foram se espalhando pela Terra, após o episódio da Torre de Babel (Gn 11:1-8), a história da Criação acabou se convertendo em lendas que, embora conservassem alguns fatos, incorporaram elementos mitológicos (os vários deuses, a deificação de elementos naturais, como o caos, os céus, as águas, etc., e a atribuição de personalidade egoísta a esses deuses em conflito que criaram o homem). Pela sua simplicidade narrativa, ordem sequencial e visão de propósito, a narrativa bíblica diverge de outros textos de mesma tradição literária, sendo ímpar.
“Além disso, para os cristão, é substancial que o próprio Jesus declare crer numa criação em seis dias (por exemplo, Mt 19:4, 5). Se acreditamos nEle, temos de reconhecer Sua palavra como autoridade final em toda questão.
“O teólogo Ribeiro, da PUC, afirma: ‘Eu sinceramente nem sei se os povos semitas antigos tinham essa noção da criação do Universo inteiro a partir do princípio. Para eles, a criação significava provavelmente a criação de sua própria cultura, de sua própria civilização. O que ficava fora dos muros da cidade ou dos campos cultivados perto dela era considerado o caos.’ É claro que essa afirmação é facilmente desbancada pelo texto hebraico (Gn 1 e demais capítulos em sequência). Além disso, a criação apresentada em Gênesis é um desdobramento do capítulo 1 e não uma narrativa rival. A ênfase recai na criação do ser humano e na unidade familiar; por isso, o nome utilizado para Deus é Iahweh, evocando um Deus pessoal, interessado em se relacionar com o homem que cria (enquanto Elohim designa o Criador, de forma mais geral). Não há oposição, mas ênfase.
“Se mudança de estilo literário implica em mudança de autor, então o que dizer do caso de Fernando Pessoa ou de Umberto Eco, ambos autores contemporâneo que recorrem a mudanças de estilo seguindo propósitos definidos? É muita má vontade acreditar numa contradição bíblica dessa natureza – afinal, se o caso fosse esse, um editor ou conciliaria as narrativas ou apresentaria aquela que lhe parecesse a mais confiável… No demais, os estudiosos partidários da teoria documental não chegam a um consenso sobre que partes do Pentateuco foram escritas por quem, dando um caráter arbitrário às suas listas de autores e trechos que teriam escrito (cada autor tem virtualmente a sua).
“Em suma, não há razões plausíveis para descrer do texto ou imaginar contradições; apenas, por questão de opinião, alguns preferem, contrariando as evidências, seguir essa linha.”